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UM POEMA
por PEDRO MOTA REIS
Não se vai longe correndo
não se vai longe
a carne é fraca
o vento quebra ao nosso lado as visões os sinais
as presenças de gente e de lugares de grandes
árvores solitárias
de portas que se abrem e de rostos sobre o seu
rodapé de suas cicatrizes na madeira em que se bate
não se vai longe
dói por dentro a memória
o desejo
os grandes passos as passadas ferindo lume
chispas mordentes de cavalo ou de avestruz no deserto
nas ruas imprecisas
mortalmente atentas
Não
não se vai longe
o peito ressoa
a mão grita
o olho soluça
e é por dentro um motor sufocando nas bermas
o nosso crescimento implume
Por isso é necessário
e vivente como andar de coruja ou leopardo
como rapariga apaixonada num café de vila remota
ir devagar
passo a passo
devagarinho como um ribeiro na pradaria entre
árvores de fruto e plantas campestres
pé ante pé
com os dedos adejando com os lábios
rebrilhando
e soletrar fragmentos de uma palavra serena
sonora
breve
Ir devagar
como se adormecêssemos
como se habitássemos um bosque
como se de novo chegássemos à primeira luz.
De Arte Fluvial. Coimbra, 2007.
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Imagem: Nicolau Saião
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